O processo sucessório é uma das maiores dificuldades – senão a maior – das empresas familiares.
Para se ter uma ideia, crises e conflitos no decorrer do processo são o principal fator de encerramento de empresas familiares brasileiras.
Três resultados de uma pesquisa recente realizada por uma grande consultora do mercado, que englobou 100 empresas familiares brasileiras, chamam a atenção: 38% das empresas familiares não se organizaram para lidar com questões familiares e de negócios, como a possibilidade de morte ou incapacidade dos membros-chave; 2/3 delas não preparam os herdeiros para assumir os negócios; e – como um farol anunciando a crise – sete entre dez empresas familiares não têm um plano para resolução de conflitos.
Dá para imaginar o tamanho do imbróglio?
Culturalmente, somos imediatistas e nem sempre planejamos o futuro e, mais difícil ainda, é ter de imaginar um futuro sem a nossa presença.
Porém, por pequena que seja a empresa, a responsabilidade social do empresário e empregador deve pesar. E quanto maior for a empresa, mais essa responsabilidade aumenta. Obviamente, também está em jogo o futuro financeiro das próximas gerações da família.
Empresas familiares têm como uma das características o componente emocional nas relações de trabalho. A falta de planejamento leva a sucessão para o inventário, momento em que esse componente emocional ganha altíssimas voltagens.
Decidir os rumos de uma empresa nessas condições é, no mínimo, temerário. Vale dizer, ainda, que os custos de inventários nessas condições são altos, especialmente, se acontecerem disputas judiciais.
Mas, afinal, em que se constitui um planejamento sucessório empresarial?
Na verdade, envolve várias áreas do direito. Para além das questões de sucessão, utiliza-se o direito tributário, civil, societário. É um grande kit – podemos chamar assim – de normas que devem ser aplicadas da maneira mais específica possível, atendendo às demandas da empresa e dos seus sócios, sempre no sentido de manter o lucro e, por conseguinte, honrar seu papel social.
Por meio de recursos jurídicos, contábeis e financeiros é possível diminuir drasticamente os custos da sucessão – se comparados aos despendidos no inventário, por exemplo -, elaborar regras de convivência societária, documentar direitos e deveres dos herdeiros e, de modo geral, transferir, ainda em vida, não só os lucros advindos da empresa, mas a responsabilidade de mantê-la e ampliá-la.
Afinal, se pode gerar crise, um processo sucessório pode também representar o reverso: uma renovação da empresa e adequação aos novos tempos.
É comum, por exemplo, que um filho ou filha se destaque na condução de algum departamento da empresa, que seja o empreendedor por excelência como foi o pai ou a mãe e que os demais filhos não tenham o mesmo interesse.
Por meio dos tipos de ações que cada um detém –especificar essas ações é um dos procedimentos do planejamento sucessório –, pode-se distinguir a participação de uns e de outros.
Eventualmente, um filho pode deter o poder de tomar decisões e outro apenas obter parte dos lucros, sem o direito de arbitrar acerca dos rumos da empresa. Se outros membros da família –enteados, sobrinhos, cunhados –tomam parte da gestão, seus papéis na nova conjuntura também devem ser especificados.
Há outras medidas importantes a serem tomadas ao longo do processo sucessório. Uma delas é a análise dos regimes de bens dos herdeiros, se casados. Muitas vezes, costumamos alertar para essa questão e até sugerir alterações.
Isso porque, no caso de uma sucessão repentina e a depender da situação familiar, um cônjuge pode simplesmente paralisar uma empresa.
Tão temerário quanto é um herdeiro não oficializar a união estável e, portanto, deixar em aberto a definição do regime de bens que vigora na relação.
Há empreendedores cujas empresas nada têm a ver com a família. Sendo ele detentor de cotas ou ações de várias empresas, e por isso detentor de poder de gestão.
Com sua morte, os demais sócios se verão na iminência de terem de lidar com eventuais intromissões de herdeiros nos rumos empresariais.
Ao realizar o planejamento sucessório, pode-se lançar mão de indenizações e cotas de ações. Há uma miríade de instrumentos jurídicos e financeiros aplicáveis em cada caso, para que a situação se regularize sem prejuízos para a empresa, seus sócios e herdeiros.
É importante frisar que o processo sucessório da empresa e seus instrumentos legais intercambiam-se com o testamento do seu sócio ou proprietário, constituindo uma das peças jurídicas mais importantes, a coluna vertebral da arquitetura da sucessão.
É realmente como montar um quebra-cabeça. Visto assim, não parece estimulante pensar em um planejamento sucessório? Reflexão: disso pode depender a prosperidade do negócio, enquanto o empreendedor estiver no comando, dos seus descendentes e funcionários, por várias gerações adiante!
Por Ivone Zeger 18 de Julho de 2018 às 14:32
Fonte: Diário do Comércio